Porque são as relações humanas tão complicadas?
Spoiler alert, eu também não tenho a resposta! Mas será que alguém tem? Sempre achei esta questão fascinante e ao fim de vários anos a estudar as pessoas e os relacionamentos entre pessoas, vou ficando mais convencido que o importante não é ter a resposta derradeira à questão. E digo isto porque não acredito que nós sejamos um animal racional. Penso que é mais correto afirmar que somos um animal que racionaliza. Tudo o que faz e sobretudo quando a motivação para esse comportamento é em grande parte emocional e visceral.
De facto, o que nós melhor fazemos é encontrar motivos aparentemente lógicos para justificar a grande maioria dos nossos comportamentos que nada tem de racional. Somos predominantemente passionais e abraçar esta pequena ideia pode ajudar a explicar muito sobre o estado atual do nosso planeta e da nossa sociedade humana. No entanto, entender porque é que as relações com o outro são tão complexas não garante que elas deixem de o ser, mas também não o fazer é garantir que elas nunca deixarão de o ser. E se não tenho respostas finais sobre a questão, tenho algumas ideias que me ajudam a navegar por este complexo mundo dos relacionamentos humanos. E são:
- Não assumir que o outro pensa ou se motiva como eu
- Assumir que o maior obstáculo sou eu
- Assumir que o ónus de levar o relacionamento a bom porto é meu
Não assumir que o outro pensa como eu – Porque realmente dificilmente pensará como eu. Cada qual nasce num universo pessoal distinto composto por tantas variáveis e influências diferentes. E se por um lado podemos ser todos moldados a partir do mesmo barro, não somos todos moldados por igual. As nossas circunstâncias familiares, sociais, emocionais e económicas são distintas e mesmo dentro da mesma família a vivência de dois irmãos pode ser drasticamente distinta.
Assumir que o outro pensa diferente é obrigar-me a estar atento, é obrigar-me a assumir uma posição humilde de aprendizagem e descoberta do outro como algo novo e desconhecido. Sim, é moldado do mesmo barro, mas que forças lhe deram a forma? Como seria ou pensaria eu se também tivesse sido sujeito às mesmas circunstâncias? Claro que é mais fácil interpretar o comportamento dos outros com base nas regras do meu mundo, mas isto é uma prisão que me impede de experienciar o outro na sua plenitude. Se olho para o outro e o que vejo é uma projeção de mim e da minha visão do mundo, será que posso dizer que me estou a relacionar com o outro, ou estarei apenas a usar o outro para me relacionar com alguma parte de mim?
Assumir que o maior obstáculo sou eu – Este ponto resulta do anterior, porque se na tentativa de me relacionar com o outro estou limitado por quem sou e porque aquilo que conheço do mundo, então a minha pequenez e a minha tacanhez são talvez o maior obstáculo para conseguir lidar com qualquer tipo de pessoa quer seja muito ou pouco parecida comigo. É fácil lidarmos com os “iguais”, com quem pensa ou sente semelhante. Mas quantas pessoas entram nesta categoria? E no mundo de trabalho onde temos de nos relacionar com todo o tipo de pessoas, quer tenhamos ou não afinidade com elas.
Assumir que o maior obstáculo sou eu ajuda-me a focar nos meus preconceitos, fraquezas e limitações de modo a ser capaz de desenvolver empatia e um conhecimento mais profundo sobre uma realidade que me é desconhecida. Que pessoa é esta, de onde veio, porque pensa assim? Como é capaz de ter comportamentos tão diferentes dos meus? Claro que o impulso imediato é fechar as portas a alguém que é profundamente diferente de nós, seja por medo, desconfiança ou preconceito. E lá está, mais uma vez o obstáculo sou eu e as minhas limitações. Mas assumir que o obstáculo sou eu obriga-me a estar atento a mim próprio e a refletir sobre os meus comportamentos e motivações.
Assumir que o ónus de levar o relacionamento a bom porto é meu - Ou seja, tomar o ónus de liderar o rumo da relação. É seguramente uma palavra da moda: “liderar”, mas todos nos imaginamos a liderar uma start-up unicórnio, não relações com colegas de trabalho. Só que no fundo, tudo começa com relacionamentos entre pessoas e com a capacidade de cativar e motivar o outro. Em último caso, por mais singela que seja a nossa posição profissional, todos precisamos do outro, nem que seja para criar um ambiente de trabalho saudável e positivo e neste aspeto assumir o ónus da liderança dos relacionamentos, com quem nos rodeia, é trabalhar ativamente para estar rodeado de relações positivas e benéficas para ambas as partes.
Não o fazer é arriscar ter relações azedas e perigosas. É arriscar que dois seres passionais e diferentes entrem em conflito pois as suas emoções colidem por não haver ninguém ao leme da relação. É uma escolha, é uma possibilidade, e se em absoluto a relação não depende só de uma parte, pessoalmente vivo melhor com a ideia de ter feito tudo ao meu alcance para levar qualquer relacionamento a bom porto. Nem que seja porque um psicólogo não pode desistir de ninguém.
Talvez estas ideias pareçam demasiado otimistas ou fantasiosas, mas os ideais devem servir para nos guiar rumo a um destino mais positivo. Não têm de ser verdades absolutas, basta terem o potencial de nos fazer mais realizados e plenos no nosso dia-a-dia. Se no processo conseguirmos impactar o mundo à nossa volta de um modo positivo então não terão esses ideais mais valor do que uma verdade absoluta que vive inerte no mundo teórico? Em última instância teríamos a capacidade de nos relacionarmos com qualquer tipo de pessoa com um mínimo de cordialidade e respeito, talvez o obstáculo seja mesmo nós próprios e a nossa pequenez.
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